A maldição do vencedor

 

HSM Management 57
Julho – Agosto 2006

 

Como essa linha de pesquisa serve, por exemplo, aos leilões de freqüências de ondas de rádio nos Estados Unidos, que têm sido a aplicação mais notória da teoria dos jogos nos últimos anos?

Diversos governos mudaram sua forma de agir e decidiram que seria mais justo e mais lucrativo para o Estado leiloar bandas de freqüência. No início, o problema estava em definir o desenho desse processo de leilão para as freqüências. Uma freqüência pode não ser de grande utilidade para um concorrente que não tenha, ao mesmo tempo, um grupo de freqüências próximas. Portanto, não seria aconselhável organizar leilões seqüencialmente, leiloando uma freqüência após a outra. Seria desejável para os concorrentes poder fazer lances para lotes inteiros, para garantir o conjunto certo de freqüências capaz de valorizar cada freqüência em questão.
As empresas que participaram desses leilões buscaram ajuda dos teóricos dos jogos. Nos EUA, por exemplo, a Federal Communications Commission decidiu usar um formato que é hoje chamado de "leilão ascendente simultâneo" -com licenças leiloadas simultaneamente. No fechamento de cada rodada, os participantes podem ver todos os lances para determinado grupo de freqüências e ajustar seus lances para a rodada seguinte. Hoje os pesquisadores também desenvolveram e testaram diversos outros desenhos de leilão para isso.

Até certo ponto, o primeiro desenho de leilão foi um triunfo para a teoria dos jogos e sua abordagem hiper-racional. Por outro lado, os novos desenhos também se basearam em trabalhos da economia experimental. Se não se pode confiar totalmente na idéia do comportamento humano guiado pela otimização, também não é possível confiar em um desenho de leilão sem testá-Io na prática, observando padrões de tomada de decisão humanos verdadeiros.

Minha equipe e eu, portanto, decidimos que nossa opinião deveria ter sólida base experimental. Elaboramos experimentos que refletiam a situação do leilão real o mais precisamente possível. Realizamos vários leilões assim desenhados com alunos. E os resultados dessas experiências orientaram nossa recomendação.

É realmente possível transferir o conhecimento obtido em experimentos com estudantes para as decisões multimilionárias das telecoms?

Meus experimentos não incluem apenas estudantes universitários;gestores experientes também participam deles. E, diga-se de passagem, em geral, os estudantes se saem muito melhor. É sempre a mesma história: as pessoas são excessivamente guiadas por experiências pouco compreendidas e fazem as generalizações erradas. Menos experiência pode ser uma vantagem, quando isso nos força a pensar mais.

Há um experimento interessante envolvendo leilões de lã na Austrália. Penny Burns, pesquisadora australiana, recriou esses leilões em laboratório e disse aos participantes quanto valiam diferentes quantidades de lã. Em seguida, pediu-Ihes que maximizassem seus lucros. Na média, os estudantes obtiveram lucros muito maiores do que os compradores profissionais.

Sabe como se explica isso? Acontece que, na vida real, o objetivo dos compradores de lã não era lucrar o máximo possível. Eles precisavam apenas garantir que houvesse lã suficiente para a fábrica continuar a produzir. Os profissionais fizeram lances agressivos para conseguir uma quantidade, ainda que mínima, de lã. Aprenderam a ter esse comportamento com a experiência prática, sem entender muito bem o que estavam fazendo. Quando compram pouca lã, são criticados. Quando compram muita, as críticas são bem mais leves. Se pagam um preço alto demais, podem ser criticados, porém menos do que se pagassem um preço muito baixo [e ficassem sem a lã].

Na situação de laboratório, o objetivo era maximizar os lucros, porém eles repetiram seu velho comportamento nessa nova situação, ao passo que os estudantes, que não tinham nenhuma experiência desse tipo, partiram do zero para pensar no que fazer. Podemos ver o mesmo contraste entre alunos e profissionais em experiências de opções de compra e outros experimentos.

Como, então, os gestores podem melhorar seu processo de decisão e eliminar essas distorções?

A forma mais eficiente de melhorar o processo decisório é aperfeiçoando a intuição. As pessoas que contam com grande repertório de cenários simples de gestão ou de jogos e suas respectivas análises têm intuição mais apurada e não se esquecem facilmente de aspectos importantes que devem ser considerados na decisão sobre um problema.

A maior parte dos exemplos da teoria dos jogos e mesmo os casos nas escolas de administração parecem ser simplificações irreais, não?

São irreais mesmo. Mas não importa. Proporcionam uma base para o desenvolvimento de uma boa intuição. Se os jogos fossem tão complexos quanto a realidade, não aprenderíamos nada com eles.
 

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