A Força de Vontade

 

A falta de vontade é resultado de desejos opostos. Quando alguém tem muitos desejos e uns são contrários a outros, a vontade diminui. Por isso, no Bhagavad-Guita (II/41), uma das Escrituras Sagradas da Índia, o Senhor Krishna diz:

 

Vyavasayatmika buddhir

Ekeha kuru-mandana

Bahu-sakha ky amantas ca

Buddha yo' vyavasayinam

 

"O intelecto que está estabelecido em um fim tem um só ramo e o intelecto com muitos desejos em infinidades de ramos”.

 

Por exemplo, se focalizamos os raios do sol através de uma lente, podemos queimar um papel, mas, se os raios estão dispersos, não podemos fazê-lo. Assim, quando a mente tem um objetivo definido, nossa vontade é poderosa. Na vida temos muitos desejos e muitos objetivos. Se alguém nos diz que a música é maravilhosa, começamos a aprender algum instrumento; se no outro dia alguém nos diz que o yoga é muito interessante, imediatamente começamos a meditar; se no terceiro dia alguém nos fala maravilhas da física, interessamo-nos pela física. E o resultado é que não aprendemos física nem música, nem, tampouco, meditação.

 

Ninguém pode ser perfeito em tudo. A pessoa tem que fixar seu campo de ação. Quando alguém anda simplesmente de um lugar para outro, não pode usar sua vontade apropriadamente. Não nos falta vontade, simplesmente não sabemos como usá-Ia.

 

Não há coisa alguma que não se possa fazer pela força de vontade.

 

Utilidade e Realidade

 

Temos que mudar nossa atitude: temos que aceitar qualquer ente e qualquer personalidade como existência, como realidade. Não é importante se essa existência serve ou não a meus interesses. E essa atitude ante o mundo é válida também para mim: não tenho que me preocupar se as pessoas não aceitam minha existência como algo útil. Se alguém me diz que sou feio... Muito bem, você é formoso, mas não é tão feio como eu. Você é muito alto, mas não é tão baixo como eu. Você é muito inteligente, mas não é tão tolo como eu. Quando estamos acostumados a pensar na realidade, nunca sofremos de deficiências. Temos que criar em nós mesmos esta condição. Sem esta autoconfiança não se pode viver.

 

 

Respeito à Existência

 

Dizem que um esquilo estava subindo uma montanha, e esta, muito orgulhosa, disse-lhe: “Tua existência é tão insignificante e a minha tão grandiosa! Não és nada comparado a mim!”.

 

O esquilo respondeu: “- Bem, mas tu não és tão pequena como eu". Quem disse que a grandeza é uma qualidade e a pequenez não? A pequenez é também uma grandeza. Uma coisa pequena é eficiente onde as coisas grandes não o são. Em hindu, diz-se que somente uma agulha pode costurar, não uma espada. Tudo tem sua importância e ninguém deve ter tanto egoísmo nem orgulho. Devemos entender que existe uma interrelação entre todas as coisas no universo.

 

Orgulho e Humildade

 

A humildade é uma arma invencível para conquistar o mundo. As armas atômicas podem ser vencidas, mas a humildade não.

 

Antes de sair da Índia, meu Mestre disse-me: "Meu filho, quando o açúcar está misturado com a areia, o elefante não pode desfrutar dele, mas a formiga, sim. Se nosso orgulho é como um elefante, não podemos desfrutar da glória verdadeira; mas quando somos pequenos e humildes, sim".

 

A humildade é o primeiro passo no campo espiritual. E como podemos desenvolvê-la? Pensando que todos os seres são formas de Deus e, portanto, melhores que nós.

 

Ascender é muito difícil, mas permanecer na terra não é. Por isso necessitamos elevar nosso pensamento e eliminar completamente nosso orgulho. A grandeza do homem não está em dizer: "sou grande". A verdadeira grandeza está em dizer: "não sou nada", e não somente em dizê-lo, mas em senti-lo. Aquele que não é nada é tudo. Se nós queremos ser amados por todos, temos que ser nada. Porque a pessoa que está frente a nós é um espelho que reflete nosso ego. Se eu me sinto grande, a pessoa que está em frente é tão grande como eu. Se tenho vaidade, todos a têm. Se eu digo: "eu sou", todos o dizem. Quando alguém entra em um salão muito amplo e grita: "sou muito grande", imediatamente o eco repete a mesma coisa, mas se se grita: "não sou nada", ele responderá: "não sou nada".

 

Entretanto, a autoconfiança é uma coisa e o orgulho outra. Qual é a diferença? O orgulho não nos permite aceitar as virtudes de outras pessoas. Quando tem orgulho, a pessoa pensa que no mundo não existe ninguém melhor que ela, e diz: "eu sou tudo". E quando digo "eu sou tudo", todos ficam contra mim.

 

No mundo, aqueles que têm verdadeira humildade são autenticamente livres.

 

Dignidade

 

As pessoas gostam de estar conosco quando sentem que avançam em nossa companhia e querem afastar-se quando sentem que sua personalidade perde importância em nossa presença.

 

A Interdependência é a Independência

 

Ninguém deve ter orgulho de não querer dar nem aceitar ajuda.

 

Posição e Dever

 

“Por mais insignificante que seja teu Dharma, tens que cumpri-lo e, se não o fizeres, criarás imediatamente uma alteração em todo o universo”.

 

Posição e Existência

 

Por exemplo, um pai, como tal, tem que aconselhar seu filho; mas se o filho o rejeita, o pai tem que separar sua existência de sua posição. Na profundidade de sua consciência ele tem que compreender que, como pai, cumpriu com seu dever e, portanto, como Ser, não tem que sofrer. O problema é que nós envolvemos nossa experiência com nossa posição e por isso sofremos. Não temos a capacidade de separar nossa verdadeira existência dos deveres de nossa posição.       

 

Kriya e Karma

 

Karma, que significa ação, é diferente de Kriya, que significa atividade. Qual é a diferença entre atividade e ação? Quando pomos nossa atenção em qualquer atividade, esta se torna ação. Atividade mais intenção é igual a ação. A atividade está relacionada com o mundo físico, é algo natural; não podemos evitá-la ou terminá-la, porque tudo é ativo. Quando o corpo está imóvel, o coração bate e o sangue corre.

A intenção é uma atividade mental e esta tem que se dirigir à finalidade da vida. Toda a atividade tem que ser disciplinada segundo esta finalidade. Mas se não sabemos o que somos, como podemos decidir a direção de nossa vida? Temos que decidi-Ia à luz do Conhecimento do Ser ou da Verdade Suprema. E quando compreendermos que saímos de Deus e temos que regressar a Ele saberemos que a finalidade da vida é a realização e planejaremos nossas ações de tal maneira que elas possam dirigir-nos a Ele.

 

Caridade com Compreensão

 

Antes de dar, a pessoa tem que saber de que necessita a outra pessoa.

 

Mundo de Brinquedo

 

As crianças gritam e choram quando seus brinquedos se quebram. Nós também somos crianças. Os brinquedos das crianças são de madeira ou de plástico e os nossos de carne e osso. Na realidade, não há nenhuma diferença. Como as crianças têm seu mundo de brinquedos, nós temos o nosso, e, de qualquer maneira, as crianças e nós temos que nos desapegar das formas, porque aquele que está apegado às formas tem que sofrer.

 

Apego e Sofrimento

 

Os sofrimentos surgem porque estamos apegados ao que não é permanente e esse mesmo apego não nos deixa compreender essa verdade. Quando pensamos que os filhos são para sempre, existe uma incongruência entre a atitude mental e a situação real e essa incongruência é a causa do sofrimento. Entretanto, por meio do conhecimento verdadeiro podemos chegar a compreender que no mundo não há nada permanente. E se não há nada permanente, como pode  uma relação ser permanente? Quando se busca o permanente no transitório, convida-se o sofrimento.

 

O Amor

 

Aquele que ama a alma é um amante verdadeiro e aquele que ama o corpo não sabe nada sobre o amor, é somente uma vítima de sua sensualidade; unicamente diz "eu te amo, te amo, te amo", mas em poucos dias seu amor termina. Às vezes, as pessoas divorciam-se com seis meses de casados. Que espécie de amor é esse? O prema yoga, ou yoga do amor, trata de nos convencer a amar a pessoa pela própria pessoa. Eu posso amá-Io para mim ou posso amá-Io para você.

 

Quando o amo para você, meu amor é verdadeiro e quando o amo para mim, é simplesmente uma forma de explorar seus sentimentos. Digo que o amo porque busco realizar meu interesse, como eu o amo, você me ajuda. Mas, isso não é amor, é um negócio. Você me ama e eu o amo: muito bom negócio!

 

No campo do amor verdadeiro não existe nenhum negócio, tanto faz que você me ame ou não. Eu o amo. É o amor verdadeiro. O amor verdadeiro é divino. Quando dizemos que Deus é amor, significa que temos que queimar toda a luxúria e toda a sensualidade no fogo desse amor.

 

Permanência do Amor

 

Buscar a felicidade nas coisas exteriores nos faz dependentes, escravos dela; por isso, um dia corremos atrás de uma coisa e, no outro dia, atrás de outra. Um dia dizemos a alguém: "eu te amo" e no dia seguinte dizemos o mesmo a outra pessoa. Como pensamos que o amor está no que se ama, não percebemos que o amor existe em nós mesmos. Quando buscamos o amor em outras pessoas, esse amor sempre está condicionado. E se nossa mente corre constantemente de um lugar a outro, nunca podemos amar ninguém perfeita­mente. Ao falar sobre o sacramento do matrimônio, a religião trata de fixar nossa mente em um porto. É na própria mente onde devemos buscar o amor. O amor permanente é a expressão do Ser Eterno que não busca nada externo.

 

Divórcio

 

Não sabemos nada sobre o amor: o corpo está atraído pelo corpo, nada mais. Tratem de compreender que o amor espiritual, o amor verdadeiro, é a raiz de todo o contentamento, de toda felicidade. As religiões sempre tratam de fomentar este amor, e é por isso que não aceitam o divórcio. Como pode haver divórcio? A alma unida à alma não pode divorciar-se. Somente os corpos se separam, se bem que, na verdade, eles nunca se uniram: é uma ilusão. Dois corpos em qualquer posição, sempre estão separados. Somente a alma pode unir-se à alma. Nem mesmo a mente pode unir-se à mente, porque todos temos pensamentos diferentes. Não existe unidade mental, só existe a unidade espiritual, e aquele que realiza esta unidade, esta identificação, sem dúvida pode realizar a unidade de todo o universo.

 

Disciplina

 

Sem disciplina a vida não é vida. A pessoa mais disciplinada é a pessoa mais feliz. Aquele que não está disciplinado, sempre tem problemas. A princípio, ele pensa que sua vida indisciplinada pode satisfazê-lo, mas na realidade não é assim, e quando ele compreende essa verdade, já não tem tempo nem poder para mudar.

 

Psicologia

 

A psicologia moderna é responsável por fazer o homem fraco, porque sempre justifica suas fraquezas em lugar de ajudá-lo a vencê-las. O yoga também é um processo psicológico, mas, diferentemente da psicologia, trata de ajudar as pessoas a vencer suas debilidades. O homem não deve depender da ajuda de outras pessoas. Ele tem que ajudar a si mesmo.

 

O Experimentador

 

Há muitas pessoas que dormem com os olhos abertos, mas nesse mo­mento seus olhos não vêem. Os olhos são somente instrumentos; o experimentador transcende todo o corpo, toda a existência física.

 

Se eu quisesse, poderia doar um de meus olhos ao banco de olhos, e o olho continuaria vivo. Há algo muito importante: quando o olho está comigo, eu vejo com ele, e quando ele é transplantado, outra pessoa começa a ver por ele, mas enquanto está no banco, ninguém vê por ele. Isto significa que o experimentador não é nenhuma parte do corpo, mas é muito diferente do corpo. O experimentador sou eu, o Ser.

 

O Ser não experimenta diretamente, mas através dos sentidos. Mas os sentidos não podem experimentar sem a presença do Ser, que é a consciência própria. E quando a consciência entra em contato com qualquer objeto, converte-se em experiência. Todavia, a consciência pode existir sem a experiência. Infelizmente, as pessoas identificam a experiência com a consciência.

 

A experiência é simplesmente uma manifestação da consciência. Em outras palavras, a consciência pode existir sem a experiência, mas a experiência não pode existir sem a consciência, do mesmo modo que a luz não pode existir sem a eletricidade, mas a eletricidade pode existir sem a luz. Sem dúvida, nós não vemos com a eletricidade, vemos com a luz; mas não podemos dizer que a luz é mais importante que a eletricidade. Assim, nós buscamos ter muitas experiências, mas nenhuma é mais importante que a consciência.

 

Tudo está baseado na consciência.

 

Viver no Presente

 

Nosso problema sempre é como viver este momento. E um momento o que é? É uma questão muito complicada.

 

As pessoas dizem: Eu vivo no presente. Muito bem, mas que é o presente? Em termos gerais, talvez seja a época, mas, se particularizarmos mais, o presente pode ser este ano. E depois? Este dia, esta hora... Mas afinal, que é o presente? Um minuto? Um segundo? Uma fração de segundo? Vamos dividir e dividir o tempo, mas sempre teremos problemas para definir o presente.

 

Que é o presente?

 

Quando nós dividimos a totalidade do, tempo, compreendemos que não resta nada mais que a consciência. Então, que é o presente? A presença da consciência, nada mais. Que significa dizer que estou vivendo no presente? Que eu sou consciente sem estar consciente de nada. Que eu sou somente Eu. E que significa isso? A meditação. Ser consciente sem ser consciente de nada é a meditação.

 

A questão é que até que nós sejamos conscientes sem ser conscientes de nada, nossos problemas não vão ser resolvidos. Todos os milagres e mistérios dependem somente de ser consciente de algo, e ser consciente de algo não é a solução de tudo. Nós temos que chegar a um ponto no qual não estejamos conscientes e nada ou de qualquer coisa. É muito difícil, porque não chega­remos a ele enquanto não nos tivermos liberado de nosso algo.

 

Meditação

 

Vocês podem ter a experiência da meditação pessoalmente.

Devem sentar em frente a um espelho e olhar fixamente a própria imagem. Depois de certo tempo, vão chegar ao ponto em que não verão outra coisa a não ser o próprio reflexo. E depois só parte dele. Finalmente, talvez vão conseguir não sentir nada por uma milésima parte de um segundo, pois tudo vai desaparecer. E quando voltarem, surpreendidos, vão se perguntar: onde eu estava? Na realidade, o momento durante o qual a pessoa esquece completamente de tudo é o momento da felicidade suprema. As pessoas sentem-se felizes somente recordando as coisas mundanas, mas eu lhes digo que a verdadeira felicidade está em esquecer de tudo por completo. E até que não tenhamos esta experiência, não nos sentiremos livres. Aquele que nunca dormiu profundamente, não conhece o prazer de dormir e pensa que sonhar é maravilhoso. Mas deixar os sonhos é melhor que tê-los. No sonho se pode ser um rei, mas nenhum sonho é permanente.

 

Devemos buscar o ponto no qual não exista nada que nos influencia, porque quando algo nos influencia, sentimos que nossa alegria depende disso.

 

Milagre ou Desejo?

 

As pessoas, quando oram, pensam que Deus vai escutar suas orações e que vai atendê-las. Mas muito poucas compreendem que é somente sua mente concentrada que consegue todos os resultados. Não há nenhum milagre, exceto nossa mente, mente que é incrível e muito profunda. E quando nós oramos com fé, entramos nela com mais e maior profundidade. Tudo existe em nós.

 

Se queremos obter água, temos que escavar a terra. E aquele que tem a coragem de fazê-lo mais profundamente obtém ferro, prata e ouro. Se cavar mais, finalmente chegará ao centro a terra, onde todo peso se reduz a nada. Assim, quando tratamos de entrar em nossa mente, podemos conseguir muitos poderes, mas ao final chegamos ao ponto em que o peso do mundo não nos toca, em que os problemas do mundo não existem, e nesse momento, nenhum milagre nos é necessário.

 

Um milagre pode ter valor hoje, mas amanhã, não. Se um santo me dá de beber por meios milagrosos, somente vai satisfazer minha sede de agora. Porém, mais tarde, quando eu sentir fome, sua água milagrosa não vai me satisfazer. Qualquer coisa do mundo tem seu limite e nos pode satisfazer somente em um campo, não em todos. Por isso, temos que chegar a um ponto no qual não tenhamos nenhum desejo, porque os desejos e os objetos dos desejos estão invariavelmente relacionados. Para aquele que não tem desejo, não existe nenhum milagre. Por exemplo, alguém pode dizer: Swami Tilak é um grande mago porque pode produzir ouro, mas nesse caso, eu seria um mago somente para aqueles que desejaram ouro. Como uma vaca não tem esse desejo, para ela, Swami Tilak, o mago, não é ninguém. Qualquer coisa mundana tem um valor limitado e esse valor sempre é proporcional aos nossos desejos e necessidades, pois são de origem mental e por meio da meditação nós tratamos de limpar nossa mente.

 

Quando nossa mente não sentir mais nenhuma necessidade, seremos mais que reis; nesse momento, não teremos nenhum apego nem desejo, tampouco medo ou atração; estaremos perfeitamente estabelecidos em nosso ser e compreenderemos que todo o mundo está girando em volta de nós e que nós não temos que girar ao redor dele.

 

A Pulsação

 

Qual é a definição da pulsação?

 

Algo toca nossos dedos e logo não os toca. A pulsação é tocar e não tocar, subir e descer. Subir é a vida e descer é a morte. Na pulsação, estão, simultaneamente, a vida e a morte.

 

A Mudança Contínua

 

Que forma é permanente?

 

A criança, em alguns anos, se faz jovem, e o jovem faz-se velho. E não podemos dizer que se trata de uma mudança de dias ou de semanas: é um processo constante. O problema é que nossos sentidos não percebem essa mudança constante. Tudo está mudando todo tempo. Coisa alguma é permanente, nem sequer por um momento. Nenhuma coisa.

 

Um momento é uma coisa muito grande; até a menor fração do momento presente, está nos mudando. Nunca somos fisicamente o que éramos. Em cada momento está a mudança, mas infelizmente não estamos conscientes desta verdade e dizemos: "eu sou velho ou eu sou jovem". Na realidade, existe um processo contínuo desde a concepção até a morte.

 

E depois da morte?

 

Este processo não termina com a morte. Nossos sentidos nos enganam.

 

O Medo da Morte

 

O problema no mundo é que as pessoas têm muito medo da morte. Atualmente, os psicólogos dizem que o homem deve aprender a morrer, que não se deve morrer inconscientemente, que se deve saber em que momento se aproxima a morte e aprender a enfrentá-la. Não obstante, quando alguém começa a falar sobre a morte, as pessoas dizem:- Por favor, não toquem nesse tema!". Mas a morte é uma realidade. Até que ponto podemos fechar os olhos para ela? Na verdade, a morte é mais evidente que Deus. Nós não conhecemos a Deus, mas vemos a morte.

 

Fazemos uma série de disciplinas físicas para manter o corpo forte. E depois? Tanto o corpo débil como o forte tem que seguir o mesmo caminho; ambos têm que entrar no cemitério. Não estou dizendo que nos deixemos morrer em nome da espiritualidade, mas que, quando é inevitável deixar o corpo, não devemos apegar-nos a ele. Temos que criar esta força em nós mesmos.

Por exemplo, um homem caminha por uma selva, vê que um leão vem atrás dele e, para escapar do medo, fecha os olhos e se põe a pensar em sua esposa, seus filhos, sua casa e sua conta no banco. Maravilhoso! Sente-se um rei. Mas logo que abre os olhos e olha para trás, ainda o persegue o leão com a boca aberta. E não sei de que lhe podem servir, nesse momento, as delícias dos sonhos.

 

Não há nenhuma solução, nem técnica para evitar esse problema. Somente existe o Conhecimento. A morte não é tanto o problema, mas o medo dela. A morte é natural. O medo é mental e temos que vencê-lo por meio do conhecimento verdadeiro. Não há outro método. Não há.

 

Que é a Morte?

 

A morte é como a cebola: pode-se tirar todas as suas camadas e ao final não fica nada, porque nada existe em seu centro. Assim, quando tratamos de analisar o conceito da morte, não fica nada, já que a morte, na realidade, não é coisa alguma, é simplesmente o reflexo de nossa ignorância. Porém, o sentido da morte criado pela ignorância pega nossa mente e faz com que pensemos mais na morte que na vida, e apesar disso já queremos escutar falar da morte.

 

Aquele que não tem o sentido de morrer, não deve temer a morte. Devemos analisar: existe ou não a morte? Qual é sua forma? Qual é seu conceito? E vamos dar-nos conta que a morte é somente uma mudança; sem dúvida, uma grande mudança...

 

Reencarnação

 

Não podemos lembrar quantas vezes temos sonhado, do mesmo modo que ninguém pode saber quantas vezes a luz apareceu em uma lâmpada ou quantas ondas manifestaram-se no Oceano. O Senhor Buddha diz que é mais fácil contar as gotas do Oceano do que as gotas de leite que a gente tomou de suas mães, porque ninguém sabe quantas vezes já nasceu e nem quantas vezes foi amamentado.

 

Nascer e morrer é como andar por uma circunferência: pode-se percorrê-la quantas vezes se quiser, mas não se achará dela o fim. Uma onda surge no mar e morre na costa, mas ressurge.

 

No Bhagavad-Guita, o Senhor Krishna diz:

 

Vasamsi jirnani yatha vihaya

Navani grhnati naro parani

Tatha sariram vihaya jirnany

Anyani samyati fiavam dehi (II/22)

 

“Assim como um homem desfaz-se de suas roupas velhas, assim também

o Ser deixa seu corpo gasto e põe vestes novas”.

Este é seu conceito sobre corpo, mas que nos diz sobre o Ser, sobre a

alma?

 

Nainam chindanti sastrani

Nasinam dahati pavakah

Na cainam kledayanty apo

Na sayati marutah (II/23)

 

"As armas não podem matar o Ser, o fogo não pode queimá-Lo, o vento

não pode secá-Lo e a água não pode molhá-Lo."

 

É a natureza do Ser.

 

Encarnação e Reencarnação

 

A matéria é constante, somente mudam as formas. A mudança é natural. Todo tempo estamos mudando como as ondas do mar... Chega um momento em que uma onda não pode manter sua forma e toma outra forma completa­mente nova.

 

Estamos mudando constantemente, mas quando chegamos ao ponto a que chamamos morte, a forma presente transforma-se completamente e adquirimos outra forma, outro corpo. Exceto por esta diferença, a morte e qualquer momento da vida são o mesmo. No momento presente, em certo sentido, também estamos morrendo. A única diferença é que, depois da mudança diária, os outros podem reconhecer-nos, mas depois da mudança chamada morte, não.

 

Quando diminuímos a temperatura da água, ela começa a mudar continua­mente; mas logo que chega a zero grau, a mudança é tão radical que não podemos reconhecer a água como água. Entretanto, a Força Eterna está presente no momento de mudança radical, ou de outra maneira nada poderia resistir à mudança; as coisas destruíram-se ao passar por ela. Se elas não se destroem é pela Força da Eternidade que está presente além da forma. Esse Poder, essa Energia, essa Verdade Eterna é conhecida como Cristo, Krishna, Buddha...

 

Essa Força sempre esteve presente, mas Ela nos era desconhecida porque os olhos não podiam vê-La. E no momento da mudança radical em que aparece esse Poder, infelizmente não o reconhecemos.

 

Qual é a diferença entre encarnação e reencarnação? A forma reencarna, mas a Essência, encarna. A Essência somente aparece, não muda, enquanto a forma está mudando, e por isso falamos de reencarnação, quer dizer da mudança de uma forma em outra. Mas a base, a Essência, simplesmente aparece. Aparecer é encarnar e mudar é reencarnar. Se dizemos que reencarnamos é porque, quando falamos de nós mesmos, costumamos nos referir à nossa forma, isto é, não ao Ser Supremo ou puro Ser, mas ao ser criado.

 

Ilusão

 

Às vezes dizemos que nossos olhos nos enganam. Uma pessoa que viaja de trem sente que as árvores estão correndo, mas na realidade não é assim que as coisas se passam. É uma ilusão criada pelos sentidos. De um lado temos ilusão e de outro as coisas verdadeiras. Entretanto, também as coisas que nos parecem verdadeiras têm seus limites; não são eternas. Por exemplo, quando vemos uma mesa, podemos deduzir que houve um carpinteiro e umas ferra­mentas que a construíram; mas quando a pomos sob um potente microscópico, defrontamo-nos somente com átomos; e se pomos um átomo sob um microscópico mais potente ainda, o átomo também desaparece e só vemos elétrons, prótons e nêutrons. E finalmente, se tratamos de compreender essas partículas carregadas de eletricidade, chegaremos a saber de que na realidade não existe nada mais que energia. As formas desaparecem. Podemos dizer que as formas são criadas pela limitação de nossa visão e desaparecem pela sua amplificação. Para uma pessoa que vê através de um microscópico, as formas desaparecem imediatamente, como desaparecem os sonhos para quem desperta. No sonho vemos muitas coisas, mas logo que despertamos deixamos de vê-Ias. Assim, com a visão limitada, vemos as formas e, com a visão amplificada, não as vemos.

 

O Mundo é um Salão de Espelhos

 

"Teu próprio Ser é teu amigo e teu próprio Ser é teu inimigo”. Isto significa que o Ser vencido por si mesmo é nosso amigo e o Ser vencido por outras coisas é nosso inimigo. Cada dia, pela manhã e pela noite, devemos meditar em nosso Ser e devemos perguntar-nos: "Quem sou eu?" Em algumas ocasiões vamos sentir que somos o corpo, em outras, que somos a mente ou o ego, até que passamos a dar-nos conta que estamos além do ego. Nesse momento seremos livres, perfeitamente livres.

 

Regresso à Fonte

 

Se uma pessoa em um quarto começasse a gritar: "Não há luz! Tudo está escuro!"

 

Eu lhe perguntaria: "Como pode dizer que não há luz?" Nesse momento ela teria que aceitar que anteriormente conheceu a luz. Assim, quando uma pessoa diz que não está feliz, que não tem tranqüilidade, invariavelmente está indicando que anteriormente conheceu a paz, a tranqüilidade e a felicidade.

 

A espiritualidade diz: "Regressemos ao ponto onde tínhamos tranqüilidade, paz e felicidade". Temos que fazer algo para regressar a esse ponto.

 

O problema está em definir de onde viemos. Alguém pode dizer que caímos do paraíso e outro pode afirmar que saímos do ventre de nossa mãe, mas ninguém pode negar esta verdade: saímos do Ser mesmo. Todos os dias saímos do Ser e regressamos ao Ser. Quando estamos terrivelmente cansados e dormimos, que estamos fazendo? Estamos regressando a nós mesmos; e não desejamos sair de nós mesmos até que tenhamos descansado perfeitamente. Quando a gente está cansado, quer regressar ao próprio Ser. Agora, eu pergunto: estão vocês cansados?

 

Se estão, têm que regressar ao Ser.

 

A Vida Está e o Ser É

 

Que é o homem?

 

Para nós, um homem é algo diferente do que é para si mesmo, porque para nós ele é sua aparência, e para si mesmo ele está além de toda aparência. Ninguém pode estar consciente de sua aparência todo o tempo. A pessoa somente lembra sua forma quando vê seu reflexo em algum espelho e, no entanto, ela sempre está consciente do Ser mesmo. Embora nós vejamos, nunca nos vemos a nós mesmos - especialmente no sono. Quando estamos conscientes de nossa aparência, criamos vaidade em nós mesmos, e quando estamos livres do sentido da forma, estamos também livres da vaidade; nesse momento podemos apreciar a existência dos outros e assim amá-los. Somente uma pessoa que não está consciente de sua individualidade, de sua forma, pode amar.

 

Por isso, é necessário deixar todos os atributos de sua personalidade; em outras palavras, a pessoa tem que se desnudar completamente. E dois seres que se desnudam por completo podem desfrutar do amor verdadeiro. Eu não estou falando de se desnudar no sentido físico, estou falando no sentido espiritual.

 

Somente aqueles que não tenham as vestes do ego podem amar-se mutuamente de maneira apropriada, de outro modo, o amor não é possível.

A água que está em dois vasos não pode unir-se enquanto existam dois recipientes; para que se unifique, os vasos têm que se quebrar. Assim, o Ser está contido em recipientes, e para que a alma se una à alma, esses recipientes têm que se quebrar. Temos que fazê-lo. É um grande trabalho. Podemos quebrar qualquer copo muito facilmente, mas o recipiente do ego é tão forte, que é muito difícil quebrá-lo. E quem pode quebrá-lo sem transcendê-lo? Aquele que diz que está dormindo, não dorme, e aquele que dorme e não diz que está dormindo.

 

Aquele que diz que está amando, não ama, e aquele que ama não diz que está amando. Porque quando nós expressamos o amor em palavras ele perde sua sinceridade e sua intensidade. A pessoa tem que amar, tem que sentir que está amando. E somente quem está além do ego pode amar verdadeiramente.

 

Uma pessoa assim diz: "eu não sou, mas sou". Em um sentido eu não sou e em outro sentido eu sou. O que sou agora, não sou; e o que sou, não sou agora.

 

A gente tem que conhecer o que é. A dificuldade é que confundimos estar com ser. A personalidade, a individualidade, está, mas não é. Então, devemos conhecer o que somos. Tudo o que está é criação de nosso pensamento e a fonte de tudo o que se cria é o que somos. Eu sou, e porque sou, tudo está. E sem ser, ninguém nem nada pode estar. A vida está e o Ser é.

 

Sat-Chit-Ananda

 

Que é o sorriso?

 

Por que se sorri?

 

Eu pergunto: quem sorri? O corpo?

 

A matéria não pode sorrir. As pedras não sorriem, porque o sorriso é indicação de vida. Somente os seres viventes sorriem, e ainda assim, nem todos os que vivem o fazem. Às vezes, alguém está terrivelmente zangado e não quer falar conosco, nem nós com ele. Então, não podemos dizer que a alegria é produto da existência física. O sorriso é expressão da alegria interna. Não me estou referindo ao sorriso do diplomata, porque o diplomata sorri simplesmente por hipocrisia, sem estar alegre, e apesar disso, até seu sorriso é uma imitação do sorriso verdadeiro. O sorriso verdadeiro surge da alegria interna e esta alegria está relacionada ao Ser.

 

Não se pode dizer que a alegria é um produto da mente, dos pensamentos; pelo contrário, é a alegria interna que se manifesta neles. A alegria é algo inexplicável, é a natureza do Ser. Do mesmo modo que a luz passa pelas frestas de uma parede, nossa alegria interna passa pelas frestas de nossos pensa­mentos, que estão na parede de nossa mente.

 

Por isso, em sânscrito existe um termo para descrever Deus, Brahman, que é Sat-Chit-Ananda. Sat significa Verdade, Chit significa Inteligência ou Consciência e Ananda, Felicidade. O próprio Ser é Verdade, é Consciência ou Inteligência, e é Felicidade. Ninguém pode proporcionar-nos a Verdade, a Inteligência, e a Felicidade. Tudo está em nós mesmos e somente temos que derrubar a parede que está ao redor de nosso Ser.

 

Emancipação

 

Temos que compreender que somos o que somos e que com a liberação não vamos conseguir nada novo. Temos que tirar de nós o que não somos. E o que é que não somos? Os desejos, o ego.

 

Quando a gente quer polir um pedaço de ferro, tira-se ou acrescenta-se algo? Polir significa tirar. Polir é perder. Perder metal e ganhar brilho. Assim também, no sentido do Ser, não temos que agregar nada, simplesmente temos que polir a mente. O problema é que a mente sempre quer receber não está disposta a deixar. A gente quer receber a Deus, quer receber ao Ser e quer receber a paz, sem compreender que a paz não se tem que obter, mas a inquietação é que se tem que tirar. A paz é a natureza do Ser, a tranqüilidade é uma propriedade interna. Ainda que neste momento não percebamos, existe a paz em nós mesmos.

 

E como poderíamos obter o que já existe em nós?

 

Por isso, quando nos Estados Unidos perguntaram a um grande santo da Índia chamado Swami Ramathirta: “- Que temos que aprender?", ele respondeu: “- Não temos que aprender. Somente temos que esquecer o que aprendemos!”.

 

Assim, nós não temos que conseguir nada, temos que tirar o mundo que entrou em nós; temos que tirar de nossa consciência tudo aquilo que é diferente do Ser mesmo. Por isso, o Veda diz: "neti, neti, neti..." "Isso não é, isso não é, isso não é”.As pessoas perguntam: “- Por que o Veda fala em termos negativos?" A verdade é que, em relação ao Ser, não podemos ter "coisas" positivas. O Ser é positivo e tudo que é diferente do Ser é negativo. Temos que tirar o que é negativo: as relações e os reflexos do mundo.

 

... O ponto não pode ser um ponto sem estar relacionado com outros pontos. E quando não pensamos em outros pontos, quando não temos nenhuma referência acerca de outros pontos, esse ponto se dissolve no infinito imediatamente.

Dissolver o ponto no infinito é a emancipação.

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